Friday, May 30, 2008

Sen.ti.dos

Sinto o vento embalar meus fios de cabelo e ouço os sons do mundo numa sinfonia enigmática, porém cortês. Vejo as cores, até na falta das cores. E vejo a vida fluindo entre as ruas, os rios, os precipícios, e nas estradas - de tão perfeitas, rotas. Vejo a ventura e a depressão, ambas nas lágrimas e nos sorrisos destas pessoas. Vejo os cegos, e vejo os que não querem ver. Vejo os surdos, e os que não sabem ouvir. Vejo os deficientes, e vejo os covardes. Vejo marionetes de mãos juntas, de olhos fechados. Esquizofrênicos. Vejo a incerteza na certeza destes, e já os basta. Vejo os que dizem querer viver a vida intensamente, mas não sossegam até saber o final da história antes do meio, antes até do começo. Sinto o toque sutil e devastador do sofrimento, trazendo o aprendizado, o amadurecimento, o sorriso sincero. Trazendo identidade. Sinto a água gostosa que vem das fontes de liberdade, aguando os campos para que nunca deixe de lá florescer. Sinto as sensações, e já me basta. Vejo a paixão no olhar do desconhecido, e vejo também as flores de plástico, que enfeitam minha sala de estar, mas sem exalar perfume algum. De beleza evidente, e sentimento leviano, porém, suficiente. Vejo e sinto. Novas faces, novos gostos, novos perfumes. Vejo mais que sinto, pois uma parte ainda permanece dormente, mas os olhos atentos vivem, até nas noites de sono. Vejo o sol brilhar mais intenso a cada dia. Ouço os pássaros que anunciam não haver nada como um dia após o outro. Ouço o noticiário, o rádio, a TV. Ouço mais que a mim mesmo, e já me basta. Vejo a inocência na criança, e somente nesta, virtude encontro. Vejo espelhos miúdos refletirem um mundo inteiro. Vejo os pais serem semáforos, uns cheios de nervura, outros de tolerância. Vejo as batidas, e vejo os culpados. Vejo também o trovador e sua inspiração inconscientemente cônscia. Vejo o romantismo, a mágoa, a esperança, a descrença, o drama, as utopias. Vejo as personagens deste enredo desperdiçando a vida e temendo o incerto, e não me assemelho. Não me assemelho. Vejo as nuvens em forma de novidade. Vejo a rotina, vejo os carros correndo, vejo a morte, vejo tudo ao ver que ainda não vi quase nada. Vejo além do que se crê, além do que se toca, além do que se vê, e já me basta.

(Dimas Gomes)

Monday, May 26, 2008

Rapidinha...

...do lorde Juiz Bowen:

"The rain raineth on the just,
And also on the unjust fella.
But chiefly on the just, because
The unjust hath the just's umbrella."

(A chuva choveu sobre os justos,
E também sobre os camaradas injustos.
Mas mais sobre os justos, porque
Os injustos tinham dos justos o guarda-chuva.)

(Enquanto isso, no maior best-seller do Mundo...)

"Porque ele faz nascer o seu sol sobre os maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos"

Mateus 5:45

Thursday, May 22, 2008

A Última Rosa


Eis surgido dos cacos uma nova espécime.
Um brinquedo humano errante, olhar meio distante,
Coração pulsante, respiração ofegante, ainda brevipene,
E uma paz interior jamais vista.

Fala pelo silêncio e observa a tudo, quedo.
Seu vigor surpreendente moldado sobre sua amargura.
Tanto vigor recusa a ofensa daqueles
Que reduziram a pedaços seu palácio de porcelana.

Aqueles enfeites ambulantes, vivendo por viver,
Procrastinando, sempre, a desgraça de suas existências.
Esses, um dia, repesos, serão ofuscados
Pela luz resplandecente daquela criatura.

E talvez, cegos, se pôr irão a descortinar os pedaços intocados da reforma.
E com corte profundo, prestes a arranhar os últimos fios de arrependimento,
Suicidarão.

Tal brinquedo, rebanhado em negrume, assistirá ao enterro de tais vermes,
Lançar-lhes-á aos reles caixões uma última rosa:
A rosa do orgulho.

Do ar que se respira, dos dias que se vive,
Das quedas que criaram impérios.

De ser quem é, sem ser qualquer.

(Dimas Gomes)
Feel(ona) Apple

I said, "honey, i don't feel so good, don't feel justified. come on put a little love here in my void", he said "it's all in your head", and I said "so's everything", but he didn't get it. I thought he was a man, but he was just a little boy...

(Eu disse, "Querido, não me sinto muito bem, não me sinto justificada. Vamos lá, ponha um pouco de amor aqui no meu vazio". Ele disse "isso é coisa da sua cabeça", e eu disse "e o que não é?", mas ele não entendeu. Achei que ele fosse um homem, mas era só um garotinho...)


Trecho de "Paper Bag" que deu base ao roteiro de um dos clipes da Fiona Apple que mais gosto.

Tuesday, May 20, 2008

Rebuscando o rebuscado...

Sim, ambos sabemos. Sobreviverias, se impérvio. Celebrarias em poesia novas canções preferidas. Camuflarias a fábula inacabada com desertos de novidades. Criarias novas vozes, novas formas. O que não sabes é que estes óculos quebrados, num deslize previsível, sangraram teus olhos, te cegaram por um instante. E agora, tu os mantém fechados por um receio vulgar, aceitável. A facilidade te seduz, o sofrimento te afasta, a ferida te previne, mas e teu coração? O que este te fala em silêncio, e guardas em mais oculto segredo? O que este deseja em desespero, e recusas em tal convencional sobriedade? Que canção canta o teu coração? Deixa-os, deixa-lhe, deixa-me ouvir, pois coração não desafina, por mais alto que seja o tom. Pois coração não perde o ritmo, não arranha, não repete versos desnecessariamente. Teu coração, eu sei, não sabe que horas são. Não sabe a que horas o dia se despede, não sabe do clima, da estação. Teu coração não precisa saber. Não precisa saber se o sol virá ou não. Teu coração pede calmaria, mas pede aventuras. Teu coração não mente, meu amor. Não mente.
(Dimas Gomes)

Monday, May 19, 2008

Ponto de Equilíbrio

Sigmund Freud ressalta, em “O mal estar na Civilização”, de 1930, que “no auge da paixão, os limites entre o ego e o objeto ficam ameaçados de dissolução, os apaixonados regridem ao narcisismo ilimitado e vivenciam o sentimento oceânico de serem um só”. Alguns românticos mais fervorosos não se conformam com tal designação. Pelo contrário. Interdependência é sinônimo de felicidade em seus dicionários. Já os mais “insensíveis” consideram essa regressão teorizada por Freud como um dos geradores do fim da liberdade com o início do casamento. E quem tem a razão? Ambos. A pergunta que fica é: o conflito de pensamentos continua? Não precisamente.

Ao se percorrer o caminho racional e o emocional, não se pode trilhar pelas extremidades. Deve sempre haver um ponto de equilíbrio. Mas, como conciliar a liberdade ao casamento? Como agir de acordo com a própria determinação, quando o matrimônio aduna os parceiros, formando um ser preso à subordinação e às satisfações, e, no geral, a um novo modo de vida? Uma única palavra responde qualquer dúvida sobre essa conciliação: limite. Mas, e esse limite? Como pode ser determinado? A partir de uma outra importante palavra: respeito. Quando se há respeito recíproco pelo parceiro, como ser humano, antes que marido ou mulher, a raia é perfeitamente determinada.

Porém, deve-se levar em conta que certas decisões para uma pessoa casada têm um campo de opções mais estreito que o das solteiras. Mas isso é um ponto a ser pensado antes mesmo de assinar compromisso, para não haver arrependimentos.

Por fim, um casamento harmonioso, equilibrado, não é uma garantia de longa duração, mas sim uma dependência mútua satisfatória que se prolonga sem rebaixar nenhum dos dois parceiros.
__________________________________________________________

Redaçãozinha de escola do ano passado. Professor Chico passou a me chamar pelo nome a partir desta. Aos outros ele chamava por "abençoados".

"A" de aleluia, Chico! Amém +.

Saturday, May 17, 2008

Onde está Damien Rice?

Nada fora do comum. Nada estranho. Quase nada de nada. Aquele mesmo velho cenário, aquela mesma velha chuva, e nenhuma explosão. Aí, algo fora do comum, algo estranho, surge do nada. Eu vi uma nave espacial voando pela sua janela. Você viu quando ela foi embora?

Amie, senta aqui no meu muro. Lê pra mim a história de "O". Me conte como se ainda acreditasse que o fim desse século vai trazer alguma mudança pra mim e pra você.

(...)

Nada fora do comum. Nada mudou. Só envelhecemos um pouco, só isso. Você sabe quando encontra algo especial porque você sente quando eles tiram isso de você. Tá aí, uma coisa que eu aprendi.

Aí, algo fora do comum, algo estranho, surge do nada. Mas eu não sou um milagre e você não é um santo. É só mais um soldado na estrada que leva a lugar nenhum.
__________________________________________________________

Damien Rice, como de praxe, em "Amie", estimulando toda aquela esperança no amor, na empatia mútua, no não-conformismo e na velha "luz no fim do túnel". Afinal, quem é pessimista nos dias de hoje?

Wednesday, May 14, 2008

Acontece nas melhores famílias...

Espancou-lhe, carminou-lhe e beijou-lhe de boa noite. Observou enquanto seus olhinhos fechavam-se. As pálpebras trêmulas; os rios, perturbados, pareciam dançar a ode ao temor, o canto dos poltrões. Foi a primeira vez em que se viu diante de um abismo. Saltaria, se o pudesse, mas seus pés estavam presos aquele espelho. No reflexo, o seu pavor e seu ódio, adunados contraditoriamente a seu sentimento de vergonha e compunção. Encostou a cabeça no travesseiro, e adormeceu.

(Dimas Gomes)
O Que Fala O Silêncio

Que eu não renuncie, mesmo que o pior se anuncie e o medo subestime a realidade. Que eu não jogue fora a paz que a incerteza, contraditoriamente, me cedeu.

Que eu não deixe de sorrir, mesmo quando vir ressurgir a depressão do mundo, me distraindo, na tentativa de me reconquistar. Que eu a logre, uma e outra vez.

Que eu não contrafaça os erros e que controle meus anseios. Que eu não deixe de cair, mas que aprenda a me reerguer com cuidado e rapidez.

Que eu não desmereça os ao meu redor, uma vez que, quando estive só, conheci alguém merecedor de minha maior valorização.

Que eu compreenda que certas coisas só entendemos e provamos em nossos últimos minutos de vida. Que eu as compreenda nos meus últimos minutos de vida.

Que eu sempre espere o que virá a me complementar, não o que virá a me completar por inteiro, como se eu abrigasse dentro de mim somente vazio. E que eu não perca meu vazio, pois já diziam: perder o vazio é empobrecer.

Que eu creia no amor como uma constância de insanidade ponderada e eterna enquanto durar. Que não tente descrever, só viver, e possa reconhecer quando não mais durar.

Que eu não acorde sorrindo, mas que eu sorria antes de dormir. Que eu, às vezes, chore antes de dormir para acordar sorrindo.

Que eu ouça quando o silêncio vier me confessar, desabafar, suas tristezas e alegrias, suas loucuras e manias. Que eu entenda tal linguagem.

Que eu não ouse desafiar a obviedade, as aparências, as precipitações. Que eu não me deixe ser iludido pela essência borrifada nas flores de plástico.

Que a beleza das cores obscuras possa ser aproveitada nas pinturas rabiscadas à pele crua de quem vos fala, e nunca estrague qualquer obra de arte ainda inexistente.

Que eu saiba diferenciar os erros do mundo dos erros que cometo. Que eu não prometa o que não possa cumprir, e que eu não desperdice tal materialização de sentimento.

Que eu aproveite de cada história, trágicas ou felizes, cada pedaço de aprendizado, cada partícula de sabedoria, cada lição da qual possa ser extraída.

Que eu não, nunca, me perca, somente se para me encontrar um pouco mais. Que eu não tente me achar nos livros mais vulgares, mas nos que mais dizem com poucas palavras.

Que aqueles a quem amo possam sentir-se amados sem ao menos uma palavra de minha boca, um olhar revelador de meus olhos, e que sejam felizes. Eis o egoísmo camuflado e despercebido, e que preza, uma outra vez, por um sorriso meu mais sincero.

(Dimas Gomes)

Monday, May 12, 2008

...guess who's back?

E estamos voltando, finalmente, quase um ano tendo se passado. Eu e meus eus pra todos os vocês, a favor dos nós de todos nós.

Est-ce que je suis en retard?