Monday, June 02, 2008

Semideiro


Um demônio colubrino na pele de um cordeiro
Lacera-me o peito, extirpa-me as entranhas,
Incinera meus olhos, tritura meus lábios,
Impinge-me seco, como um deus ao calino.

Invado-o e crava-me como a terra o esteiro -
Um mar de deleites em meio a barganhas:
Chora sua dor terebrante em gemidos ávidos
Choro minha dor surda num brado supino.

Sobre meu ventre, as lágrimas do desejo meeiro,
Em seu negror, minhas lágrimas e suas artimanhas,
Adormecido, por fim, o queimor de nossos avios,
Desperta a lucidez morosa e meu pesar repentino.

E nos vestígios intactos deste semideiro
A sinfonia inebriante de notas risonhas:
Canta-me eloqüente o amor em timbres áridos
E canto-lhe calado o meu desatino.

(Dimas Gomes)

3 Comments:

Blogger Ary Régis said...

SENSUALÍSSIMO. Sou tão doido que até senti um perfume (juro!).

"Canta-me eloqüente o amor em timbres áridos
E canto-lhe calado o meu desatino."
Algumas passagens se iluminam mais, né? Não tem como.

Digno de ser declamado.

10:25 AM  
Blogger Gabriela. said...

Fui lendo o poema e tentando pintar a imagem e em todo seu comprimento, pintei imagens de horror e sangue, pesadas.
Mas na última estrofe(Sim, como o amigo acima vou colar aqui, pq quero toda a estrofe)
"E nos vestígios intactos deste semideiro
A sinfonia inebriante de notas risonhas:
Canta-me eloqüente o amor em timbres áridos
E canto-lhe calado o meu desatino."

Essa última estrofe é de uma bela sensibilidade, Dimas!
Desfecho que se encerra em si nos deixando suspensos num nada, uma sensação forte.

Huuuum :)

5:53 PM  
Blogger Loredana said...

Não tem como não apreciar com demasia esse poema fantástico!
Essa ultima estrofe ,eu nem comento.
"Canta-me eloqüente o amor em timbres áridos..." carai Dimas,ta perfeito.

Nunca li e imaginei assim uma cena dessas sendo contada de uma forma maravilhosamente elegante e sensual.Rebuscada,mas leve,breve.
ficou muito bom,pra variar. :D

ps: tu bomba! =*

6:26 PM  

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